13 de set. de 2007

Solução cangaceira



O conjunto de secretices, proibições, impedimentos e truculências que caracterizou a votação do “caso Renan” me fez lembrar a votação das “diretas”, lembram? Quando a ditadura proibiu o acompanhamento da seção que votaria as “diretas” pela mídia e o glorioso congresso brasileiro manteve as eleições indiretas, inclusive com o voto do Zé Sarney? O Sarney continua lá e o congresso continua muito parecido com aquele. Seguindo o típico modelito cangaceiro, a primeira providência de Renan Calheiros foi convocar todo o aparato da segurança do Congresso para fazer valer pela força a proteção ao voto envergonhado que manteve seu mandato. A violência de seu leões de chácara contra os deputados que queriam ingressar no plenário mostrou que não existe diferença entre ditadura militar e ditadura cangaceira. Os milicos eram execrados pela civilização democrática mas se lixavam para a opinião da intelectualidade internacional, uma vez que estavam garantidos pela proteção do poderio anticomunista norte-americano. Renan Calheiros também sabe que é execrado pela civilização brasileira mas se lixa para a opinião do Brasil decente, uma vez que tem a proteção dos interesses da turma do Lula e do PT. Queiramos ou não, Lula é poder e é do PT. Ou seja, o PT é poder. A catarinense Ideli Salvatti tem isso muito claro e sabe que se não brigar pelo poder do PT ela perde seu significado como expressão política, impensável em outras circunstâncias. Estará muito iludido, portanto, aquele que acredita que as broncas que o Lula dá no PT e as alianças por interesse que o Lula faz com Deus e o mundo, a ponto de causar ciumeira em seu partido, serão motivo para o petistas abrirem mão de suas boquinhas ricas e romperem com a causa maior do partido, muito parecida, aliás, com a dos milicos: se manter no poder o quanto der. A abstenção de Aloísio Mercadante foi emblemática: ela significa que a sem-vergonhice institucional do PT é mais forte que a honestidade individual de seus membros. É simples: ao perder de lavada a eleição para a prefeitura de São Paulo para José Serra Mercadante sacou que não tem vôo próprio. Ou seja, seu destino está desgraçadamente atrelado ao destino do PT. Para bem ou para o mal. Mercadante, portanto, não tinha saída. Teve que fazer o jogo de Renan Calheiros. A verdade é que, enquanto Lula for presidente e sustentar os altos índices de popularidade que mantém entre o povo mais pobre, obedecer ao presidente vai ser o único caminho do PT se segurar nas pernas. Fora disso, é o mensalão. E assim o PT continua sendo uma carona e tanto para manter empregos, mandatos e força para adiar as penas por formação de quadrilha. Prova disso é o fato de José Genoíno, professor Luizinho e outros mensaleiros terem passado impunemente pelas urnas. O partido do presidente da república, queiramos ou não, significa muita coisa quando o povo está comendo o que não comia. Nada impede, porém, que sapateemos de raiva, é o tal do júris esperneandis. Jânio de Freitas, colunista da Folha de S. Paulo ilustrou com magnitude a situação: disse, com todas as letras, que “Renan Calheiros é o homem certo no lugar certo”. Perfeito. Ninguém representa melhor o Congresso Nacional do que Renan Calheiros. Da mesma forma que, provavelmente, ninguém representa melhor o povo brasileiro do que Luiz Inácio Lula da Silva. O caso Renan Calheiros poderia ter sido uma bela oportunidade de demonstrar certa contradição nessa representatividade, que Lula não tem nada a ver com Renan. Mas no aperreio da circunstância, Lula e o PT provaram que não é bem assim, que dá, sim, para juntar cangaceiros e cabras lascados no mesmo barco, que dá para juntar coronéis e caboclos na mesma panela, que dá para juntar Lula e Renan no mesmo conluio. Lula e os petistas apesar de terem tomado uma decisão arriscada também não são idiotas e contam com uma variável determinante: povo com a boca ocupada mastigando não tem tempo para protestar contra questões tão subjetivas como “quebra de decoro parlamentar”. Foi em suas bases que a abstenção petista se deu conta de que o problema estava circunscrito à exploração política de certa “imprensa burguesa”. Para o povo, Renan estava encrencado porque chifrou a mulher e a amante quer dinheiro. Na periferia isso se resolve com umas cachaças e umas porradas. No cangaço também.

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